Tribuna do Interior

Tocantins, Sexta-feira, 19 de abril de 2024.
07/08/2020 - 17h16m

Lei Maria da Penha completa 14 anos: quem é a mulher que deu nome à lei que protege outras mulheres de violações dos direitos humanos

Ascom SECIJU 
Foto: Divulgação
Maria da Penha, a mulher que deu nome a lei que protege outras mulheres
Maria da Penha, a mulher que deu nome a lei que protege outras mulheres

O caso Maria da Penha é representativo da violência doméstica à qual milhares de mulheres são submetidas em todo o Brasil. A sua trajetória em busca de justiça durante 19 anos e 6 meses faz dela um símbolo de luta por uma vida livre de violência.

Shara Rezende/ Governo do Tocantins

Neste dia 7 de agosto, a Lei Maria da Penha, Lei nº 11.340, completa 14 anos sendo do um marco na luta contra a violência doméstica à qual milhares de mulheres são submetidas em todo o Brasil. A Lei criou mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, além de estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

A Assessoria de Comunicação da Secretaria de Estado da Cidadania e Justiça (Seciju) irá fazer uma série de reportagens sobre os 14 anos da Lei nº 11.340 e nesta primeira matéria irá apresentar, com base em informações do Instituto Maria da Penha, quem é a mulher que deu nome à Lei que protege as mulheres contra violações dos direitos humanos.

Quem é Maria da Penha

Maria da Penha Maia Fernandes nasceu em 1º de fevereiro de 1945, em Fortaleza-CE, é farmacêutica bioquímica e se formou na Faculdade de Farmácia e Bioquímica da Universidade Federal do Ceará (UFCE) em 1966, concluindo o seu mestrado em Parasitologia em Análises Clínicas na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo em 1977.

Foi durante o mestrado, em 1974, que Maria da Penha conheceu o homem que seria seu marido e violentador, Marco Antonio Heredia Viveros, colombiano, à época, ele fazia os seus estudos de pós-graduação em Economia na mesma instituição. Foi naquele ano, que eles começaram a namorar, e Marco Antonio demonstrava ser muito amável, educado e solidário com todos à sua volta. O casamento aconteceu em 1976. Após o nascimento da primeira filha e da finalização do mestrado de Maria da Penha, eles se mudaram para Fortaleza, onde nasceram as outras duas filhas do casal.

Início da Violência

Com a mudança para Fortaleza e a conquista da cidadania brasileira, estabilidade profissional e econômica, as agressões começaram a acontecer por parte de Marco Antonio, que agia sempre com intolerância, exaltava-se com facilidade e tinha comportamentos explosivos, não só com a esposa, mas também com as próprias filhas. O medo constante, a tensão diária e as atitudes violentas tornaram-se cada vez mais frequentes.

O Crime

Em 1983, Maria da Penha foi vítima de dupla tentativa de feminicídio por parte de Marco Antonio Heredia Viveros, primeiro, ele deu um tiro em suas costas enquanto ela dormia, como resultado dessa agressão, Maria da Penha ficou paraplégica devido a lesões irreversíveis, constam-se ainda outras complicações físicas e traumas psicológicos.

No entanto, Marco Antonio declarou à polícia que tudo não havia passado de uma tentativa de assalto, versão que foi posteriormente desmentida pela perícia. Quatro meses depois, quando Maria da Penha voltou para casa – após duas cirurgias, internações e tratamentos –, ele a manteve em cárcere privado durante 15 dias e tentou eletrocutá-la durante o banho.

Diante da grave situação, somente com a ajuda da família e os amigos, Maria da Penha conseguiu apoio jurídico e foi providenciada a sua saída de casa sem que isso pudesse configurar abandono de lar; assim, não haveria o risco de perder a guarda de suas filhas.

A Luta por Justiça

O primeiro julgamento de Marco Antonio aconteceu somente oito anos após a dupla tentativa de feminicídio, em 1991. O agressor foi sentenciado a 15 anos de prisão, mas, devido a recursos solicitados pela defesa, saiu do fórum em liberdade.

O segundo julgamento só foi realizado em 1996, no qual o seu ex-marido foi condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Contudo, sob a alegação de irregularidades processuais por parte dos advogados de defesa, mais uma vez a sentença não foi cumprida.

Maria da Penha, mesmo fragilizada, continuou a lutar por justiça, e foi nesse momento em que escreveu o livro Sobrevivi... posso contar (publicado em 1994) com o relato de sua história e os andamentos do processo contra Marco Antonio. E em 1998 o caso ganhou dimensão internacional, Maria da Penha, o Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) denunciaram o caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA).

Então, em 2001 e após receber quatro ofícios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, o Estado Brasileiro foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. A história de Maria da Penha significava mais do que um caso isolado: era um exemplo do que acontecia no Brasil sistematicamente sem que os agressores fossem punidos.

Com isso, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos deu algumas recomendações ao Estado Brasileiro, como por exemplo: completar o processamento penal do responsável da agressão e tentativa de homicídio; proceder a uma investigação a fim de determinar a responsabilidade pelas irregularidades e atrasos injustificados que impediram o processamento rápido e efetivo do responsável; adotar as medidas necessárias para que o Estado assegure à vítima adequada reparação simbólica e material pelas violações aqui estabelecidas; e prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra mulheres no Brasil. Foi após isso que a Lei nº 11.340 nasce.

Como Surgiu a Lei

Conforme se verificou, foi preciso tratar o caso de Maria da Penha como uma violência contra a mulher em razão do seu gênero, ou seja, o fato de ser mulher reforça não só o padrão recorrente desse tipo de violência mas também acentua a impunidade dos agressores.

Diante da falta de medidas legais e ações efetivas, como acesso à justiça, proteção e garantia de direitos humanos a essas vítimas, em 2002 foi formado um Consórcio de ONGs Feministas para a elaboração de uma lei de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Após muitos debates com o Legislativo, o Executivo e a sociedade, o Projeto de Lei n. 4.559/2004 da Câmara dos Deputados chegou ao Senado Federal (Projeto de Lei de Câmara n. 37/2006) e foi aprovado por unanimidade em ambas as Casas. Assim, em 7 de agosto de 2006, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei n. 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha.

Considerando que uma das recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização foi reparar Maria da Penha tanto material quanto simbolicamente, o Estado do Ceará pagou a ela uma indenização e o Governo Federal batizou a lei com o seu nome como reconhecimento de sua luta contra as violações dos direitos humanos das mulheres.

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